Notícias

Ministra Cármen Lúcia mantém liminar que suspendeu a posse de vereadores suplentes

12/11/2009 | 3689 pessoas já leram esta notícia. | 5 usuário(s) ON-line nesta página

A ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha refutou objeções e votou pela manutenção da liminar concedida por ela em 2 de outubro passado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4307, proposta ao Supremo Tribunal Federal (STF) pelo procurador-geral da República, que suspendeu a posse, retroativa às eleições de 2008, de vereadores suplentes.

A posse dos suplentes está prevista no inciso I do artigo 3º da Emenda Constitucional (EC) nº 58/2009, promulgada pelo Congresso Nacional em setembro passado. Esta emenda, que alterou o sistema de cálculo dos números de vereadores, prevê que a mudança já deve aplicar-se às eleições de 2008.

A ministra votou, também, pela concessão de liminar na ADI 4310, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) com igual objetivo da ADI 4307. Ambas ações deverão ser posteriormente julgadas em seu mérito.

Alegações

Tanto o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, quanto a OAB, autores das duas ADIs, apresentam como principal argumento contra o dispositivo por eles impugnado o fato de ele ofender o artigo 16 da Constituição Federal (CF).

Por esse dispositivo, lei que altera o processo eleitoral não poderá ser aplicada a eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência. E, segundo os autores das ADIs, as eleições de 2008 se regeram por outra lei e já tiveram seu processo encerrado com a posse dos eleitos e a decisão de questões a ela referentes.

A OAB sustenta, também, que o dispositivo impugnado é um casuísmo e que, por ser a história brasileira "repleta de casuísmos", o artigo 16 da Constituição estabeleceu o princípio da anterioridade para as regras sobre eleições.

Insegurança jurídica

A ministra Cármen Lúcia disse que concedeu a liminar rapidamente, em função da insegurança jurídica que a aplicação imediata do inciso I do artigo 3º da EC impugnada estava causando.

Ela lembrou que procuradores-gerais eleitorais de vários estados já haviam orientado os juízes eleitorais a impugnarem a posse de suplentes nas câmaras de vereadores. Também, segundo ela, em 29 de setembro, foi proposta uma ação civil pública contra a posse de dois suplentes na Câmara de Bela Vista, em Minas Gerais, ao mesmo tempo em que era questionada a posse de cinco suplentes em Icó, no Ceará.

Ressaltou ainda que, em 28 de setembro do ano passado, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Ayres Britto, orientou os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) no sentido de que a data limite para alterar o número de vereadores pelas regras vigentes para as eleições de 2008 era o mês de junho do ano passado, data das convenções partidárias em que foram escolhidos os candidatos dos partidos que iriam concorrer às eleições.

Entretanto, como observou a ministra Cármen Lúcia, na data de ajuizamento da ADI do procurador-geral da República, diversos vereadores já haviam sido empossados, e muitos outros estavam em vias de tomar posse. Assim, segundo ela, corria-se o risco de serem empossados vereadores que poderiam produzir leis sem validade.

Manutenção

Ao votar pela manutenção da liminar, a ministra argumentou que o pleito foi encerrado em 2008 e que a posse de suplentes, agora, afrontaria a soberania popular, prevista nos artigos 1º,  parágrafo único, e 14 da CF.

Afrontaria também, no entender dela, o disposto no artigo 5º, inciso LIV, que não admite a privação de liberdade sem o devido processo legal. É que, segundo ela, "o voto é a liberdade falada", e "transgredir esse direito de manifestação agride não só um artigo da Constituição, mas a liberdade de manifestação em si".

Outro ponto por ela destacado é que o artigo 29 da CF, em seu inciso I, prevê a eleição dos vereadores para mandatos de quatro anos, em pleito direto. Assim, a posse de suplentes, agora, criaria um novo tipo de vereador, com mandato mais curto.

Ela também sustentou que o suplente é o vereador não eleito, questionando como seria possível dar posse a quem não foi eleito por vontade e sufrágio popular.

Diante disso, ela questionou se, não havendo possibilidade de garantir segurança jurídica quanto ao passado - o respeito às normas que regeram o pleito passado -, como seria possível garantir segurança jurídica para o futuro.

Referendo

"Pelo exposto, em face da urgência qualificada e dos riscos objetivamente comprovados de efeitos de desfazimento dificultoso, proponho aos eminentes pares seja referendada a medida cautelar que deferi nos termos e fundamentos apresentados e que agora acabo de reiterar com efeitos ex tunc (retroativos desde a publicação da Emenda Constitucional), sustando-se os efeitos do inciso I, do artigo 3º, da EC 58/09 até o julgamento final da presente ação", disse a ministra Cármen Lúcia, ao concluir seu voto

"Quanto à ADI 4310 (proposta pela OAB), eu proponho o deferimento da cautelar. Tudo isto, para garantir o respeito à Constituição Brasileira e, em especial, para se assegurar o respeito ao cidadão eleitor, à sua decisão e ao seu direito de saber das regras do jogo democrático antes do seu início e da certeza do seu resultado, sem o que não me parece que haja garantia da Constituição e sem respeito à Constituição não há democracia",

Defesa da posse

Na sessão de hoje à tarde, o advogado do Senado sustentou que a mudança do número de vereadores, já agora, não interfere no processo eleitoral de 2008 e que, pelo contrário, o aumento do número de integrantes dos legislativos municipais aumenta a representatividade popular. Observa também, no seu entendimento, ao disposto no inciso V do artigo 1º da CF, que estabeleceu o pluralismo político como um dos fundamentos  em que se assenta o Estado democrático de direito.

"A definição do número de vagas de vereador está fora do processo eleitoral", sustentou ele. Para exemplificar sua afirmativa, ele fez uma comparação com o que ocorre em um concurso público. A lei que o cria prevê um determinado número de vagas. Entretanto, posteriormente, uma lei pode aumentar seu número, e isso não invalida o concurso.

PTC: origem foi o RE 197917

O advogado do Partido Trabalhista Cristão (PTC), admitido entre vários amici curiae (amigos da corte) no processo, lembrou que a EC 58 tem sua origem no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 197917, em 2004. Nele, o STF reduziu em 8.400 o número de vereadores em todo o país. Segundo o advogado, naquela oportunidade, o ministro Maurício Corrêa, relator do RE, deixou claro que se tratava de uma decisão provisória, enquanto a matéria não fosse disciplinada pelo Congresso.

Ainda segundo ele, embora se tratasse de decisão provisória, logo o TSE baixou a Resolução 21.701, estabelecendo as regras de preenchimento de vagas de vereador para as eleições daquele mesmo ano, proporcionalmente ao número de sua população, observados os limites mínimo de 9 e máximo de 55 vereadores.

O advogado refutou a acusação de casuísmo. Segundo ele, pelo contrário, a EC 58 é a resposta bem elaborada do Legislativo ao decidido pelo STF no RE 197917 para fixar, em definitivo, o número de vereadores nos legislativos municipais, ao mesmo tempo em que ela restringiu os gastos das câmaras de vereadores.

Ele lembrou que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 333, que resultou na EC 58, foi apresentada em 2004 e só teve sua votação concluída, em dois turnos, pelo Plenário da Câmara, em 2008. Em seguida, foi ao Senado, onde teve sua tramitação concluída apenas em 2009.

A PEC, conforme lembrou, chegou a gerar grande polêmica entre as duas casas do Congresso, porquanto o Senado decidiu seccionar o texto aprovado pela Câmara e demorou a promulgar a parte em que houve consenso entre as duas casas. A Câmara chegou a impetrar um mandado de segurança (MS) no Supremo para que o presidente do Senado a promulgasse, mas no fim houve acordo e o MS foi retirado.

Fonte TV Justiça