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Respire fundo e compreenda o STF

09/10/2015 | 1744 pessoas já leram esta notícia. | 1 usuário(s) ON-line nesta página

Devo estar apegado ao passado ou a noções ultrapassadas de autocontenção dos Tribunais. Não consigo entender o STF fixar, em sessão administrativa, sem as luzes do contraditório, entendimento sobre Projeto de Lei aprovado e ainda sequer sancionado (Projeto de Lei 274/2015), em sentido diametralmente oposto à interpretação que há poucos dias, em sede jurisdicional, emitiu sobre a ampliação dos limites de idade para a aposentadoria compulsória pela EC 88/2015.

Na decisão jurisdicional, assentou o STF: "A aposentadoria compulsória de magistrados é tema reservado à lei complementar nacional, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, nos termos da regra expressa contida no artigo 93, VI, da Constituição da República, não havendo que se falar em interesse local, ou mesmo qualquer singularidade que justifique a atuação legiferante estadual em detrimento da uniformização." (ADI 5316 MC, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 21/05/2015, Processo Eletrônico DJe-154, Divulg 05-08-2015 Public 06-08-2015).


Na decisão administrativa desta última quarta-feira, dia 7.10.2015, a Suprema Corte resolveu debater internamente e divulgar publicamente no dia seguinte entendimento completamente novo. Para os Ministros da Corte, o recente projeto de lei complementar, aprovado em 29.9.2015, ainda não sancionado pela Presidente da República, conquanto alcance a magistratura, é constitucional, mesmo sem observar a iniciativa do Supremo Tribunal Federal prevista no artigo 93, VI, da Constituição da República. Segundo a nota, literalmente: "ficou assentado que a aposentadoria compulsória dos magistrados aos 75 anos já está devidamente regulamentada pelo Projeto de Lei 274/2015, aprovado pelo Congresso Nacional, que aguarda sanção da Presidência da República. No entendimento da maioria dos ministros, com ressalvas feitas pelo ministro Luiz Fux, a lei não apresenta vício formal, não havendo necessidade da edição de lei de iniciativa do STF para regulamentar a aposentadoria de magistrados."

Estou pasmo! Primeiro, porque o Projeto de Lei ainda não foi sancionado, não é Lei vigente, e ainda pode ser objeto de veto parcial pela Presidente da República, inclusive com fundamento na decisão do STF na ADI 5316-MC. Segundo, porque a eventual lei sancionada provavelmente será objeto de ação direta no STF, pois contraria interesses conhecidos de entidades legitimadas para a ação, o que recomendaria cautela redobrada do tribunal em seu pronunciamento antes mesmo da vigência da norma e da apreciação da matéria em sede jurisdicional. Terceiro, o risco de divergência dos Tribunais na aplicação da futura lei não é justificativa para o STF antecipar-se à própria sanção da lei e fixar entendimento novo, na intimidade de uma sessão administrativa, em sentido contrário ao que decidiu na ADI 5316-MC. Quarto, o STF não faz controle preventivo de constitucionalidade das leis em sede jurisdicional ou administrativa. Quinto, a Presidente da República goza da prerrogativa constitucional para avaliar, com liberdade e sem sugestionamento do STF, a constitucionalidade dos Projetos de Lei enviados para sanção.

A insegurança jurídica subiu mais um degrau. O STF não está vocacionado a ser um oráculo constitucional, mas parece interessado em assumir essa nova função.

Registre-se, por fim, um elogio: vivas ao Ministro Luiz Fux pela coerência!  


Prof. Paulo Modesto
Presidente do IBDP e Prof. da UFBA

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